Na era da hiperconectividade, uma nova espécie de representante público tem ganhado força: os “políticos de algoritmo”. São gestores e legisladores que moldam suas decisões conforme os trending topics, monitorando em tempo real o humor das redes sociais — e respondendo a ele com projetos de lei, decretos ou declarações relâmpago.
O caso mais recente veio de Divinópolis (MG), onde o prefeito Gleidson Azevedo (Novo) decretou a proibição do balonismo na cidade após a comoção nacional causada por um acidente com balão em Santa Catarina. Detalhe: Divinópolis sequer registra voos de balão. A medida foi encarada como um gesto vazio, feito sob medida para gerar manchetes e cliques — e não para resolver um problema real da cidade.
Outro caso notável é o do deputado federal André Janones (Avante-MG), que se consagrou como um dos maiores exemplos desse perfil. Janones se destacou durante a greve dos caminhoneiros em 2018 e ganhou ainda mais notoriedade durante a pandemia, ao liderar campanhas em defesa do Auxílio Emergencial. Frequentemente, ele define seus posicionamentos com base em enquetes feitas nas redes sociais. Em uma delas, chegou a mudar seu voto sobre a privatização dos Correios após ver o resultado da enquete.
Casos assim se repetem. O massacre em Suzano (SP), em 2019, motivou projetos que buscavam proibir videogames violentos, apesar da falta de evidência científica. Após o acidente com balão em Santa Catarina, deputados propuseram endurecer regras para a atividade que já é regulada pela ANAC. Na onda ecológica, surgiram dezenas de propostas contra canudos, sacolas e plásticos em geral — algumas sem estudo de viabilidade.
Fora do Brasil, esse comportamento também se manifesta. Em Nova York, por exemplo, um projeto de lei tentou alterar a embalagem das cápsulas de detergente Tide Pods após vídeos virais de jovens ingerindo o produto como desafio nas redes.
Por padrão, a grande maioria desses projetos de lei e decretos motivados por eventos do momento não avança no processo legislativo ou na implementação prática. Eles são criados com validade simbólica e imediata, muitas vezes apenas para atender ao clamor popular nas redes. Passado o impacto inicial, caem no esquecimento, são arquivados ou simplesmente ignorados pelo restante do Legislativo.
Quer exemplo?
- Desafio da Baleia Azul (2017–2018) Parlamentares sugeriram tipificação penal e controle de redes sociais. Nenhuma das propostas teve aprovação. A pauta sumiu quando o caso deixou os trendings.
- Aumento do diesel / greve dos caminhoneiros (2018) Houve promessas de política de preços, isenções e pautas emergenciais, mas nada sistêmico foi implementado. O tema foi explorado por diversos parlamentares que, depois, abandonaram a causa. Hoje, o preço do diesel é o dobro do que era na época — e o assunto praticamente desapareceu da pauta política.
- Vacina obrigatória x liberdade individual (2021) Durante a pandemia, vários PLs queriam tornar vacinação obrigatória (ou proibir essa obrigatoriedade). Quase todos foram arquivados ou perderam relevância com o fim da emergência.
O fenômeno levanta uma questão incômoda: até que ponto o político deve responder às demandas imediatas do algoritmo? E quando essa sensibilidade se transforma em oportunismo? Projetos feitos no calor da comoção, sem estudo ou planejamento, acabam muitas vezes engavetados — mas já cumpriram seu papel: aparecer.
Na política de algoritmo, a reação vale mais que a solução. Mas o algoritmo muda. O que viraliza hoje será esquecido amanhã. A legislação, os gastos públicos e as prioridades reais — essas permanecem. E aí fica a pergunta: estamos sendo governados por representantes ou por influenciadores digitais de mandato?
Conteúdo faz parte da Coluna Poder, assinada por Adelino Júnior, que acompanha os bastidores da política no Triângulo Mineiro.
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