
O Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (HC-UFTM), em Uberaba, protagonizou um feito raro na medicina pública do país: a realização de dois transplantes renais simultâneos a partir de um mesmo doador. O procedimento, ocorrido no sábado, 25 de outubro, mobilizou duas equipes completas em salas de cirurgia diferentes e marcou um dia histórico para a instituição, que é vinculada à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).
Segundo o urologista Solon Quintão Henriques Júnior, a logística do transplante duplo exigiu uma organização incomum. “Normalmente, a gente faz um transplante e, depois, o outro. Mas, como eu e o Dr. Osmar Eustáquio Ribeiro de Souza estávamos de plantão, conseguimos dividir as equipes, anestesia, enfermagem, instrumentação, e operar ao mesmo tempo em duas salas. E tudo isso num sábado à noite, enquanto o hospital mantinha o atendimento normal às urgências”, relatou.
Os rins de um mesmo doador só podem ser transplantados simultaneamente quando há compatibilidade imunológica entre receptores disponíveis. A escolha dos pacientes leva em conta marcadores como a tipagem sanguínea e o sistema HLA, explicou a nefrologista Maria Paula Santos Fontes, da Unidade de Sistema Urinário. “Um paciente que acabou de entrar na fila pode ser mais compatível do que outro que espera há dez anos. O critério decisivo é biológico, não cronológico”, afirmou.
A chefe da unidade, Andrea Silva Dutra Tirones, destacou a raridade da coincidência. “A última vez que o HC-UFTM realizou dois transplantes renais simultâneos com rins do mesmo doador foi há cerca de 15 anos. Não é comum que a compatibilidade e o hospital coincidam dessa forma.”
Duas histórias, um mesmo doador
As duas pacientes, Raimunda Meireles Machado, 57, e Raquel Borges Flores, 56, receberam os rins do mesmo doador e compartilham agora uma ligação que chamam de “irmandade de rim”.
Raimunda, em hemodiálise desde 2019, esperou seis anos e quatro meses na fila. “Foi o maior presente da minha vida. A hemodiálise prende a gente, não pode viajar nem sair de casa. Agora vou poder cuidar da minha mãe, visitar minha filha em São Paulo, viver de novo”, disse emocionada.
Raquel, por outro lado, estava na fila há apenas cinco meses. Diagnosticada com insuficiência renal crônica há sete anos, ainda não havia iniciado o tratamento de hemodiálise. “Foi uma coincidência feliz. Receber o rim foi um presente de aniversário”, contou ela, que completou 57 anos dois dias após a cirurgia.
A equipe responsável pelo transplante é composta pelos nefrologistas Alcino Reis Mendes e Maria Paula Santos Fontes, o enfermeiro Mauro Gomes Júnior e o médico responsável técnico Vilmar de Paiva Marques. Todos integram o Ambulatório de Transplante Renal da UFTM.
Para a nefrologista Maria Paula, a experiência reforça o preparo e a capacidade técnica do hospital. “Conseguir realizar dois transplantes simultâneos, garantindo o mesmo padrão de qualidade e segurança, é algo que nem todos os grandes centros conseguem. Fizemos isso porque toda a equipe se mobilizou. O resultado está sendo excelente para ambas as pacientes.”


