
Pela primeira vez desde que suas denúncias resultaram na apreensão do segundo maior diamante do Brasil, de 647 quilates, a Carbono Mineração se manifestou publicamente. A empresa confirmou que a suspeita de furto em suas operações de extração de diamantes ocorreu em abril de 2025, em uma área de lavra no Rio Araguari, em Araguari, no Triângulo Mineiro.
As denúncias feitas pela Carbono motivaram uma investigação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Agência Nacional de Mineração (ANM). A apuração começou enquanto a pedra passava pelo processo de certificação internacional, o Certificado do Processo Kimberley (CPK), exigido para que diamantes possam ser comercializados legalmente no exterior.
No fim de agosto, durante o último lacre do certificado, a PF apreendeu o diamante, em Brasília. A peça, avaliada em milhões de dólares, foi descrita por peritos como o segundo maior diamante já encontrado no país, atrás apenas do “Sergipe Star”, de 726 quilates, descoberto em 1941.
Disputa pela origem
A investigação gira em torno de uma disputa sobre a real origem da pedra. A Diadel Mineração Ltda., sediada em Coromandel (MG), no Alto Paranaíba, foi a primeira a divulgar o achado, afirmando que o diamante foi extraído de seu garimpo no Rio Douradinho. A empresa registrou a pedra no Cadastro Nacional de Comércio de Diamantes (CNCD), em maio deste ano.
A Polícia Federal e a ANM, no entanto, apuram se o diamante teria sido furtado da Carbono Mineração, em Araguari, e transferido para Coromandel com o objetivo de “esquentar” a documentação e conferir aparente legalidade à extração.
A ANM determinou que a Diadel apresente documentos detalhando toda a cadeia de custódia do diamante, incluindo planilhas de produção, identificação de funcionários com acesso ao material, pareceres técnicos e relações com a Carbono Mineração.
Caso se confirme que a Diadel declarou informações falsas, o episódio pode configurar falsidade ideológica, com pena de até cinco anos de prisão, além de multa.
Evasão fiscal e suspeita de desvio
Além do possível furto, o Ministério Público Federal (MPF) acompanha o caso diante da hipótese de que o diamante tenha sido vendido por valor inferior ao de mercado, o que indicaria tentativa de reduzir impostos. Se comprovada, a manobra configuraria evasão fiscal, crime previsto na Lei nº 8.137/1990.
Em nota, a Carbono Mineração afirmou colaborar integralmente com as autoridades e reforçou “sua total confiança nas investigações e na atuação das instituições competentes”.
Nome de peso no setor
Um dos nomes envolvidos é o do comerciante Oswaldo Borges da Costa Netto, conhecido como Wado Borges, figura influente no comércio de diamantes em Minas Gerais. Wado afirmou ter atuado apenas como avaliador técnico e intermediador na exportação da pedra, negando ser o comprador.
Vídeos que circulam nas redes sociais mostram o empresário sobrevoando garimpos em Coromandel e exibindo a gema nas mãos. Ele é apontado como a pessoa que teria levado o diamante, de táxi, até a sede da ANM, em Belo Horizonte, no dia da apreensão.
A residência de Wado, em Nova Lima (MG), foi alvo de mandado de busca e apreensão da PF no dia 24 de setembro. Outros dois mandados foram cumpridos em Coromandel e Nova Ponte, também no Alto Paranaíba.
Histórico e novas suspeitas
A Diadel Mineração, que reivindica a propriedade do diamante, é administrada desde 2024 pelo empresário Carlos César Manhas, de 63 anos. Ele tem histórico de envolvimento com o comércio de pedras preciosas e foi detido pela PF em 2002, em Rondônia, por posse de diamantes oriundos da Reserva Indígena Roosevelt, área de mineração proibida.
Na época, Manhas foi condenado por receptação de bem pertencente à União e acusado de manter relações comerciais com grupos israelenses que atuam no mercado internacional de diamantes, vínculos que, segundo fontes do setor, persistiriam até hoje.
Em nova nota, a Diadel defendeu a legalidade da extração e afirmou que técnicos da ANM estiveram presentes no garimpo no dia da descoberta para “atestar oficialmente o achado”.
Os advogados da Diadel são os mesmos que representam Wado Borges. A defesa de ambos sustenta que a denúncia da Carbono Mineração se baseia em “supostas conversas obtidas por aplicativos de mensagens” e que os atos da ANM “podem repercutir negativamente na imagem do Brasil no mercado internacional de diamantes”.
Posição oficial
Procurada pela reportagem, a Agência Nacional de Mineração informou que não pode confirmar nem negar detalhes do processo, que é sigiloso. Em nota, a agência destacou que “atua com base na legalidade, impessoalidade e eficiência” e que possui “competência para adotar medidas administrativas acautelatórias sempre que necessário”.
Enquanto a investigação avança, o diamante permanece sob custódia da ANM. O caso, que envolve milhões de reais, disputas entre mineradoras e suspeitas de fraude documental, segue como um dos episódios mais complexos da mineração brasileira recente.


