CCJ conclui votação de projeto sobre demarcação de terras indígenas

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara concluiu, nesta terça-feira (29), a análise do projeto que trata da demarcação de terras indígenas. A proposta segue para o Plenário.

O texto-base do projeto foi aprovado na semana passada, mas ainda faltavam [[g destaques]] que poderiam mudar o texto. Todas as tentativas de alteração, no entanto, foram rejeitadas.

Assim, fica aprovado na íntegra o [[g substitutivo]] do relator, deputado [[Arthur Oliveira Maia]], ao Projeto de Lei 490/07 e a 13 outras propostas que tramitam em conjunto.

O projeto principal submete a demarcação de terras indígenas ao Congresso Nacional. O texto apresentado pelo relator é mais amplo, não trata de demarcação por lei, porém traz outros temas polêmicos como o chamado marco temporal e mudanças no usufruto pelos povos originários, com a possibilidade, por exemplo, de instalação de bases, unidades e postos militares, expansão da malha viária, e exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico.

O substitutivo apresentado pelo relator considera terras indígenas:

  • aquelas tradicionalmente ocupadas pelos índios, por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições;
  • as áreas reservadas, consideradas as destinadas pela União por outras formas que não a prevista anteriormente; e
  • as áreas adquiridas, consideradas as havidas pelas comunidades indígenas pelos meios admissíveis pela legislação, tais como a compra e venda e a doação.

Marco temporal
O texto busca consolidar em lei a tese do marco temporal. A proposta garante como terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros apenas aquelas que, na promulgação da Constituição de 1988, eram simultaneamente: por eles habitadas em caráter permanente; utilizadas para suas atividades produtivas; imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar; e necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

A comprovação desses requisitos deverá ser devidamente fundamentada e baseada em critérios objetivos. A ausência da comunidade indígena na área pretendida em 5 de outubro de 1988 impede o direito à terra, salvo em caso de conflito possessório, fato que deverá ser devidamente comprovado.

O substitutivo proíbe a ampliação de terras indígenas já demarcadas e considera nulas demarcações que não atendam aos preceitos estabelecidos pelo texto. Os processos administrativos de demarcação de terras indígenas ainda não concluídos deverão ser adequados às novas regras.

Se for verificada a existência de justo título de propriedade ou posse em área tida como necessária à reprodução sociocultural da comunidade indígena, a desocupação da área será indenizável, segundo a proposta.

Mineração e garimpo
Com relação ao uso e à gestão das terras indígenas, a proposta estabelece que o usufruto da terra pelos povos originários não abrange:

  • o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;
  • a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que também dependerão de autorização do Congresso, assegurando-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei;
  • a garimpagem nem a faiscação, devendo se for o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira; e
  • as áreas cuja ocupação atenda a relevante interesse público da União.

Ainda segundo o texto, o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa e soberania nacional. A instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão indigenista federal competente.

Também fica assegurada a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em área indígena, independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão indigenista federal competente.

O ingresso de não indígenas em áreas indígenas poderá ser feito: por particulares autorizados pela comunidade indígena; por agentes públicos justificadamente a serviço de um dos entes federativos; pelos responsáveis pela prestação dos serviços públicos ou pela realização, manutenção ou instalação de obras e equipamentos públicos; por pesquisadores autorizados pela Funai e pela comunidade indígena; por pessoas em trânsito, no caso da existência de rodovias ou outros meios públicos para passagem.

Exploração econômica
O substitutivo faculta o exercício de atividades econômicas em terras indígenas, desde que pela própria comunidade, porém admitida a cooperação e contratação de terceiros não indígenas. Os frutos da atividade devem gerar benefícios para toda a comunidade e a posse dos indígenas deve ser mantida sobre a terra, ainda que haja atuação conjunta de não indígenas no exercício da atividade. Os contratos devem ser registrados na Funai.

Fica permitido o turismo em terras indígenas, organizado pela própria comunidade, sendo admitida a celebração de contratos para a captação de investimentos de terceiros. Por outro lado, fica vedada a qualquer pessoa estranha às comunidades a prática de caça, pesca, extrativismo ou coleta de frutos, salvo se relacionada ao turismo organizado pelos próprios indígenas.

Povos isolados
No caso de indígenas isolados, cabe ao Estado e à sociedade civil o absoluto respeito a suas liberdades e meios tradicionais de vida, devendo ser evitado ao máximo o contato, salvo para prestar auxílio médico ou para intermediar ação estatal de utilidade pública.

O texto também modifica a legislação que trata do plantio de organismos geneticamente modificados (Lei 11.460/07) para retirar a vedação ao plantio em terras indígenas.

Destaques rejeitados
Os destaques analisados e rejeitados buscavam retirar do texto:

  • artigo que estabelece o chamado marco temporal;
  • dispositivo que proíbe a ampliação de terras indígenas já demarcadas;
  • artigo que estabelece que processos administrativos de demarcação de terras indígenas ainda não concluídos deverão ser adequados às novas regras;
  • item que prevê que, no caso das áreas indígenas reservadas, se houver alteração dos traços culturais da comunidade ou outros fatores ocasionados pelo tempo que façam com que a área não mais seja essencial para garantir subsistência digna e preservação da cultura da comunidade, o governo poderá retomá-la;
  • trecho que permite a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, que poderão ser implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou ao órgão indigenista federal competente;
  • item que permite o acesso, às áreas indígenas, de não indígenas em trânsito, no caso da existência de rodovias ou outros meios públicos para passagem; e
  • artigo que faculta o exercício de atividades econômicas em terras indígenas, desde que pela própria comunidade, admitida a cooperação e contratação de terceiros não indígenas.

Na reunião para votação dos destaques, mais uma vez houve divergências entre os parlamentares.

Para a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), manter o marco temporal no texto foi um erro. “Por que marco temporal para impor uma situação de definição de terras indígenas quando, na verdade, nós que somos os intrusos? Intrusos é maneira de dizer porque, na verdade, somos todos brasileiros, mas nós que fomos chegando depois. Os primeiros habitantes deste país foram os povos indígenas. Não faz sentido esse marco temporal”, argumentou.

Já o deputado Giovani Cherini (PL-RS) comparou a proposta à uma carta de alforria. “Isso é igual à carta de alforria para os índios no Brasil: ter segurança jurídica, não ter invasão. Hoje, infelizmente, apoiados pela Funai, muitos indígenas brigam nas suas aldeias e saem a explorar outras terras. Desnecessário, até porque as suas terras são muito produtivas e hoje representam a [área da] França e Inglaterra juntas”, avalia.

Falando a respeito de destaque que pretendia retirar do texto a possibilidade de o governo retomar áreas indígenas no caso de mudanças de traços culturais das comunidades, a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR) fez uma comparação com os brancos. “Seria exigir dos brancos que permanecessem dois séculos atrás, com aquelas perucas, com aqueles saiões, andando por aí num dia quente. A cultura é dinâmica. Como a gente vai avaliar se perdeu ou não traços culturais, e mesmo assim, foi pelo processo de colonização. Muitos povos indígenas perderam as línguas, mas não foi por causa dos povos indígenas, foi pelo massacre, pela colonização forçada, pelo genocídio que muitos sofreram”, explicou.

O deputado Diego Garcia (Pode-PR), por outro lado, defendeu o texto. “Trata-se de uma medida justa e, claro, de última hipótese, onde a área ocupada pela comunidade indígena já não é mais essencial a ela, desta forma a área poderá ser retomada, dando-lhe destinação de interesse público ou à reforma agrária, duas importantes ferramentas do poder público”, afirmou.

Lideranças indígenas mais uma vez se manifestaram contrariamente à proposta em frente ao anexo da Câmara onde se localizam as salas das comissões.

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