A Polícia Federal (PF) revelou que o suposto esquema de espionagem ilegal na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL) afetou auditores da Receita Federal a partir da gravação de uma reunião em que o ex-presidente discutiu estratégias com o ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem.
O áudio da reunião teria sido gravado por Ramagem em 25 de agosto de 2020, poucos meses após o Ministério Público do Rio de Janeiro apresentar denúncia contra Flávio Bolsonaro pelo esquema de “rachadinha”. Os auditores eram responsáveis pelo relatório que originou a investigação do esquema de “rachadinha” no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
A investigação sugere que Ramagem participou de uma reunião com o então presidente Jair Bolsonaro, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, e possivelmente a advogada de Flávio Bolsonaro.
De acordo com a investigação da PF, a ação clandestina de espionagem da Abin teria ocorrido em 20 de novembro de 2020. O objetivo era descobrir “podres” e “relações políticas” dos auditores da Receita Federal. Um indicativo da clandestinidade da ação, conforme apontado pela investigação, é que a ordem era arquivar de forma extraoficial as possíveis informações encontradas contra os auditores.
Em um dos trechos da conversa gravada, Ramagem teria afirmado que, para anular a investigação contra Flávio Bolsonaro, seria necessário instaurar um procedimento administrativo contra os auditores da Receita Federal e retirar alguns deles de seus respectivos cargos.
Em outubro de 2020, o Ministério Público do Rio de Janeiro denunciou à Justiça o senador Flávio Bolsonaro, o ex-assessor Fabrício Queiroz e mais 15 investigados por crimes de organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita no esquema de “rachadinha”, ocorrido quando Flávio era deputado na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
Flávio Bolsonaro foi acusado de chefiar uma organização criminosa que recolhia parte do salário de seus ex-funcionários para seu benefício, prática conhecida como “rachadinha”. O senador nega ter cometido os crimes.
Segundo o Ministério Público, foram identificados pelo menos 13 assessores que repassaram parte dos salários a Fabrício Queiroz. De acordo com o órgão, Queiroz recebeu 483 depósitos em sua conta bancária, totalizando mais de R$ 2 milhões.
Em novembro de 2021, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou as decisões do juiz de primeira instância que havia quebrado os sigilos bancário e fiscal de Flávio Bolsonaro e outros 102 alvos.
No mesmo mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou quatro dos cinco Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Coaf, que embasaram a investigação da “rachadinha”. Com essas decisões, permaneceu válido apenas o primeiro RIF, que deu início à investigação ao detectar movimentações financeiras suspeitas de Fabrício Queiroz.
Após a anulação das principais provas da investigação pelo STJ e pelo STF, o Ministério Público pediu ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que a denúncia contra Flávio Bolsonaro fosse arquivada, ou seja, extinta sem análise do mérito.
Em maio de 2022, os desembargadores do Órgão Especial rejeitaram a denúncia por ausência de justa causa, em vez de arquivá-la. Em setembro de 2023, a 5ª Turma do STJ manteve a decisão do Órgão Especial do TJ-RJ que rejeitou a denúncia contra o senador, sem resolução de mérito.